terça-feira, 23 de novembro de 2010

A Macaca Peculiar - parte V

A infidelidade como ruptura da relação estrita de monogamia é algo que normalmente associamos ao homem. Não é difícil estabelecer esta relação, dadas as diferenças de estratégias reprodutivas. Afinal, o homem produz um grande número de espermatozóides. É o grande fecundador.

Os benefícios de trair, para o homem, podem superar os riscos, através do aumento massivo da probabilidade de transmitir os seus genes para a geração seguinte. Contudo, não nos esqueçamos que a "outra" também é uma mulher normal, com as mesmas capacidades de manipular o momento em que escolhe engravidar. E o risco de ser apanhado, pondo em causa o investimento genético com a legítima parceira é enorme. Portanto, a traição masculina não é assim tão significativa tendo em conta a capacidade biológica que o homem realmente tem para trair. Há sempre uma medição inconsciente por parte do homem relativamente a esta lógica de risco/benefício. Freud chamar-lhe-ia superego, como um conjunto de atribuições de ordem moral que nos impedem de seguir a pulsão primordial. Eu substituiria a ordem moral pela capacidade inata de medir a optimização de um comportamento.

Também não nos podemos esquecer que a mulher também trai. Senão, não haveria sustentação para o conceito de "incerteza de paternidade".

Há uns anos atrás, tomei conhecimento de dados privilegiados dos quais não posso revelar a fonte sob pena de incorrer em grave incumprimento deontológico, mas que, na generalidade, posso descrever: um estudo genético sobre uma doença hereditária era levado a cabo com famílias de uma dada região, portadoras do gene responsável pela doença. O procedimento incluía, obviamente, análise do cariótipo e dos alelos em questão, e alguns resultados foram intrigantes: cerca de 9% das crianças eram apenas filhas da mãe (não foi preciso fazer teste específico para a paternidade, dado que o modelo de transmissão para o gene em causa permitia chegar a essa conclusão; as famílias em que isso se verificava foram retiradas do estudo com um agradecimento e uma desculpa qualquer, não tendo sido reveladas as causas).

O facto é que as mulheres são igualmente infiéis, mas tendem a esconde-lo mais que os homens. estes, em muitos casos, parecem ter um desmedido orgulho nas suas facadinhas. Portanto, a infidelidade masculina tende a ser sobrestimada e a feminina subestimada, o que nos dá a ideia que os homens é que são os grandes promíscuos.

Em termos evolutivos, a infidelidade feminina poderá estar relacionada a limitações na oferta masculina. O facto de ser a mulher a escolher não significa que ela consiga fazê-lo da melhor forma dadas as opções que se lhe afiguram. Aliás, é muito frequente em meios frequentados por mulheres ouvir dizer que há poucos homens de jeito e os que existem já estão ocupados.

No acto de escolha, a fêmea humana aprecia primeiro os bons genes: homens saudáveis e robustos, fortes caçadores do Paleolítico, capazes de dotar com maior probabilidade os seus filhos com os mesmos genes e capazes de lhes dar protecção e alimento. As mulheres estão geneticamente programadas para detectar e preferir, na esmagadora maioria das vezes, essas características, que nos homens se reflectem na alta estatura, massa muscular abundante e elevada simetria facial.

Acontece que, actualmente, existem dois factores que podem por em causa a relação risco/benefício desta escolha: por um lado, a caça simbólica actual já não exige a robustez física e a saúde que a caça efectiva exigia. A inteligência e a esperteza parecem ser mais eficazes que a robustez física na angariação de recursos, ou seja, os empregos intelectuais neste momento dão mais dinheiro e notoriedade que os braçais; por outro lado, o sistema de propriedades actual e a transmissão vertical destas por herança fez surgir homens mais ricos, capazes de garantir mais recursos à descendência. Neste contexto, a mulher muito provavelmente casar-se-à com o mais rico e/ou inteligente e terá filhos com o musculado, garantindo benefícios máximos pela escolha do melhor de dois mundos. Mas provavelmente poderá usar apenas um deles para as duas funções, e o inteligente parece, actualmente, ganhar a dianteira. Ou então tem a sorte de encontrar um que tenha todas as características. Seja de que forma for, qual a mulher que não quer um homem rico, inteligente e bonito?

1 comentário:

Pedro disse...

bravo , adorei toda esta descrição evolutiva .
fiquei com uma duvida no que toca a um factor evolutivo descrito nestes textos .
quando o homem abandonou a posição de quadrúpede e passou a uma posição erecta de que forma se deram as alterações nas femeas ?
optamos por uma visão dos estudos de Darwin ? sendo que as fêmeas que não estavam munidas de lábios carnudos e/ou mamas seriam rejeitadas pelos machos ou teriam uma taxa reprodutiva inferior?

abraço Professor

Pedro Regadas